Os casos apresentam circunstâncias semelhantes e um
acusado em comum, Fernando Marinho de Melo, que já foi condenado a dois
anos e três meses de prisão, convertidos em prestação de serviços
comunitários, pelo furto de Larissa e sequestro de um outro menor, que
conseguiu fugir e fazer o reconhecimento de Fernando na polícia.

A
relatora da CPI, deputada federal Liliam Sá, disse que os depoimentos
das mães apontam para crimes em série contra meninas de famílias
carentes, residentes em diversos bairros do Rio. Segundo a deputada, as
sete mães que foram ouvidas nesta segunda afirmam que as suas filhas
continuam desaparecidas e elas questionam as investigações conduzidas
pela polícia do Rio e as decisões judiciais. "No caso da menor Amanda
Nascimento Gonçalo, por exemplo, que foi sequestrada em 2002, no Bairro
de Fátima, o criminoso confessou que matou a menina e, no entanto,
esteve preso e já está solto. O mesmo está acontecendo com o acusado
Fernando Marinho de Melo, que somente hoje foi citado em três casos, da
Michele, da Larissa e da Thaís. Ele foi condenado a dois anos e três
meses por dois crimes, o que já é questionável e, mesmo assim, a sua
pena foi revertida a serviços comunitários e ele está solto. Isso é um
absurdo!", disse Liliam Sá.
A deputada informou que nesta
terça-feira (26) se reunirá com o superintendente-geral da Polícia
Federal, Leandro Daiello Coimbra, para apresentar um relatório das
audiências realizadas pela equipe da CPI e pedir intervenção da PF nos
casos em que Fernando é citado, considerando que ele presta serviços
para a Marinha do Brasil. Liliam também vai pedir novas investigações
federais sobre as ossadas de crianças que foram encontradas recentemente
em um terreno da Aeronáutica, na Avenida Brasil. "A CPI procurou o
desembargador Paulo Rangel, no Tribunal de Justiça do Rio, para entender
o que está acontecendo com as investigações desses casos, porque temos
relatos e registros policiais datados desde 2001 e nenhuma medida
efetiva foi tomada e os criminosos continuam soltos. Precisamos de
procedimentos urgentes da Justiça. Vamos solicitar uma reunião com a
chefe da Polícia Civil, Martha Rocha, para pedir que todos os registros
policiais desses casos e que estão espalhados em diversas delegacias da
cidade, sejam concentrados num só relatório e de forma ordenada, assim
podemos entrar com processos de acordo com os acusados e suspeitos, como
acontece com o Fernando, que é citado em várias ocorrências em tempos
distintos", afirmou a deputada.
Na audiência realizada na semana
passada pela CPI, em Brasília, a promotora titular da 32ª Promotoria
Criminal do Ministério Público do Rio, Márcia Colonese, apresentou
detalhes sobre as investigações envolvendo as meninas desaparecidas no
Rio. Ela disse que a pequena Larissa foi sequestrada no dia 31 de
janeiro de 2008 de dentro de sua casa, em São Cristóvão e o acusado,
identificado como Fernando Marinho de Melo, teria se apresentado como um
técnico de TV. Segundo depoimentos de um primo da menor e de outras
testemunhas, o homem carregou a criança com a TV e a colocou em um táxi.
Colonese afirmou que Fernando foi reconhecido pelo primo de Larissa,
pelo taxista e mais outras pessoas que testemunharam a cena. Segundo
ela, o acusado presta serviços para a Marinha e “sai do navio para fazer
as vítimas, conhece seus passos, estuda as vítimas para dar o bote
certo”. E ainda traçou um perfil de Fernando: “Ele é matador, estuprador
e pedófilo”.

Os
casos das meninas desaparecidas no Rio estão reunidos num dossiê de 40
páginas, produzidas pela presidente do Portal Kids, Waltéa Ferrão. As
apurações de Waltéa tiveram início em 2001, com o caso de uma menina de
10 anos, que era moradora de Realengo, na Zona Oeste. A garota
desapareceu quando levava um primo pequeno para a escola e o caso foi
investigado pela Divisão de Homicídio, mas ninguém foi preso ou acusado.
No ano seguinte, Waltéa conta que acompanhou mais dois casos bem
semelhantes. Um foi o da menina Michele, levada por um homem, também na
Zona Oeste, quando ela estava indo ao mercado na companhia de um primo
de quatro anos. O segundo episódio foi de Thaís Lima, na época com 9
anos, que foi levada de dentro de casa, também por um homem que se
identificou como Técnico de TV. Dias após o sequestro de Thaís, a
polícia civil divulgou o retrato falado de Fernando e ao passar por uma
banca de jornal, o menor que presenciou o sequestro de Michele,
reconheceu Fernando em uma reportagem, como sendo o "homem que a levou a
Michele".
O nome de Fernando é citado em muitos outros registros
policiais envolvendo furto de crianças, que Waltéa utilizou para cruzar
informações no ano de 2005. Segundo ela, dois dias antes da menor
Roseana Aparecida Alves, de 12 anos, desaparecer no bairro de Honório
Gurgel, uma colega da mesma turma escolar também passou por uma
tentativa de sequestro, mas a ação não teve registro policial. "Nós
procuramos a família dessa menina e mostramos várias fotos de suspeitos.
Ela reconheceu o Fernando", contou a presidente Portal Kids.
Para
Waltéa, os trabalhos das CPIs da Exploração Sexual e do Tráfico de
Pessoas e Órgãos, que citam o nome de Fernando e de outros acusados de
sequestro de menores no Rio, abriram novos caminhos para uma
investigação mais aprofundada sobre os casos. Ela comentou que no ano de
2006, a Delegacia da Criança e Adolescente Vítima (DCAV) avançou
bastante nas investigações e apresentou um levantamento, comprovando que
cerca de 200 meninas haviam sido enterradas como indigentes em
cemitérios da cidade naquele ano. "Nesse período, estávamos procurando
por sete crianças. Então, a delegacia fez um pedido para peritos de
Brasília realizarem exames de DNA, comparando o material genético
extraído dessas ossadas os fornecidos pelas mães que estavam procurando
por suas filhas. Mas, infelizmente, esse trabalho não foi concluído
devido as mudanças internas na Polícia Civil.", contou Waltéa.
Mães e parentes aguardam há anos por justiça
Elisabeth
Lima contou que a pequena Thaís Lima foi levada pelo sequestrador de
dentro de casa, na Vila Kennedy, Zona Oeste do Rio, no dia 22 de
dezembro de 2002. Um primo de 11 anos que brincava com Thaís viu toda a
cena e contou para a sua família que viu o homem levando a menor. A
polícia civil fez um retrato falado pelas descrições dadas pelo menino e
ele mesmo reconheceu Fernando quando foi chamado na delegacia. "Quando o
primo dela foi chamado na delegacia para fazer o reconhecimento, os
policiais não chamaram um psicólogo para orientar e acalmar o menino e
quando ele viu o Fernando do outro lado do vidro, disse que não o
reconhecia, porque ficou com medo, achou que o homem também estava vendo
ele do outro lado. Quando a gente estava retornando para a casa, ele
contou a verdade, que tinha sido aquele homem que levou a minha Thaís",
contou Elisabeth, que voltou à delegacia e mudou o depoimento do menor.
Elisabeth
disse que o trabalho do Portal Kids tem sido fundamental para a
sobrevivência das mães que perderam as suas filhas e também uma
esperança de que a Justiça vai prevalecer. "Nós não temos paz, porque
não sabemos o que aconteceu com as nossas filhas. É um sofrimento
enorme. Mas quando nos encontramos no Portal Kids a gente consegue um
certo alento, porque conhecemos a história de cada mãe e uma dá força
para a outra. Então, as funções da entidade vão além da questão da
investigação, também dá suporte psicológico", disse Elisabeth.
A
autônoma Raquel Gonçalves, de 42 anos, convive diariamente com o dor da
perda e o medo de uma represália. Ela acredita que a sua sobrinha criada
por ela desde o nascimento, a pequena Larissa Gonçalves, tenha sido
levada por Fernando Marinho de Melo para outro país e deve ser vítima de
uma rede de prostituição. "Pelo que eu conheço dos outros casos, eu
acho que este homem entrou dentro da minha casa para pegar a Larissa e
levá-la para a exploração sexual. Eu ainda tenho uma fraca esperança de
encontrá-la. Mas quando ela foi sequestrada, nem menstruava ainda,
então, não sei se ela conseguiu resistir às violências. Outras meninas
apareceram mortas, mas eu quero saber o que aconteceu com a Larissa e o
paradeiro dela. É um direito da família", disse Raquel.
Fonte:Jornal do Brasil Cláudia Freitas
Nenhum comentário:
Postar um comentário